sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Triste Estatística: Consumo de crack já tem registros em 90% das cidades brasileiras

Triste Estatística: Consumo de crack já tem registros em 90% das cidades brasileiras


Um problema de saúde que surgiu nos maiores centros urbanos brasileiros passou a ser um desafio para as autoridades de todo o país. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios, o consumo de crack já tem registros em nove de cada dez cidades. É uma situação que os repórteres Ismar Madeira e Saulo Luiz comprovaram no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.
O sertão mineiro, no Vale do Jequitinhonha, é uma região pobre, de um povo simples. Na pequena Araçuaí, Seu Ailton sempre trabalhou duro para ganhar a vida com dignidade, e agora vê o filho de 16 anos seguir outro caminho. “Esse aí entrou lá no meu serviço, no meu comércio, pegou mercadoria minha, mas muita e muita e muita. Quando eu descobri, foi tarde”, ele conta.
Em casa, já não tem mais o que roubar. Ficaram só alguns móveis. No quarto, o material usado para consumir crack. “Enquanto tem, eu fumo”, confessa o jovem.
O problema na família é em dobro. O filho mais novo também se viciou em crack, aos 11 anos de idade. “Essa droga chegou de repente. Ela veio para destruir a gente, mas para acabar com a vida da gente”, lamenta Ailton.
A poucos quilômetros de Araçuaí, em Itaobim, é principalmente à noite que o tráfico toma conta das ruas, em várias bocas de fumo.
Em todo o Vale do Jequitinhonha, o consumo do crack chegou acompanhado do aumento da violência. No município de Itaobim, o volume de apreensões da droga cresceu 73% nos últimos dois anos. E jovens têm perdido a vida, envolvidos com o tráfico. Kaíque foi assassinado aos 15 anos de idade. E o irmão dele, Johni, foi morto aos 17 anos.
A avó diz que os adolescentes deviam dinheiro aos traficantes. “Eles vieram aqui na porta, ameaçaram eles. Falaram com eles assim: ‘Se vocês não voltarem para vir pagando de novo, nós vamos te matar, nós vamos matar vocês, todos os dois’”, ela lembra.
Os roubos se tornaram frequentes. “Principalmente em Araçuaí e na região, esses pequenos furtos realmente estão aumentando para a manutenção do vício”, avalia o tenente Gilamárcio da Rocha, da Polícia Militar de MG.
Outro jovem traz no corpo as cicatrizes do tráfico. “Já levei tijolada, tiro, já levei tapa na cara, porrada”, ele revela.
A mãe passou a usar um método radical para impedir que ele saia de casa para usar crack. “Está sempre aí na cama. Acho que já tem mais de um ano que uso essa corrente e este cadeado. Resolve porque aí ele não vai para a rua”, ela diz.
“Toda noite ela me prende na cama. É bom, para eu não ir para a rua usar droga”, diz o rapaz.
No Vale do Jequitinhonha, não existe nenhum programa de atendimento aos dependentes de drogas.
“O problema chegou ao interior. O tratamento desse problema ainda não veio”, explica Leda Marques Borges, secretária de Desenvolvimento Social de Araçuaí.
“Não há como tratar o usuário do crack em algumas instâncias, se não houver uma internação para desintoxicação. E essa internação, muitas vezes, tem que ser forçada. Senão fizermos isso, o problema vai continuar se avolumando no Brasil. Há indícios de que ele já está presente em mais de 90% dos municípios brasileiros, é um fenômeno de norte a sul, de leste a oeste. Não há mais dúvida: vivemos uma grave epidemia de uso de crack no Brasil”, alerta o sociólogo Luiz Flávio Sapori.
Mas há exemplos de que é possível superar o problema. Há dez anos, Abrão visita as famílias de dependentes químicos em Itaobim. Passou a buscar ajuda para quem pedia. Foi assim que Douglas largou o vício. Pediu socorro depois de levar um tiro na perna.
“Ajuda. Primeiramente Deus, segundo, as pessoas que me ajudaram”, ele diz sobre o que considera que foi fundamental para a recuperação.
O PM formado em enfermagem, com pós-graduação em dependência química, vem improvisando no socorro às vítimas do crack. Conseguiu o apoio de empresários, de clínicas ligadas a igrejas e da Secretaria Municipal de Saúde. Douglas está há quatro meses sem usar droga, depois de quase 15 anos de dependência.
“O vício da droga é experimentá-la. Eu, graças a Deus, tive tempo ainda. Mas tem vários que não tem tempo mais”, alerta Douglas.

G1