Mais uma vida Pataxó Hã-Hã-Hãe é ceifada na luta pela terra
Por racismoambiental
Mais uma vida indígena ceifada na disputa pela terra na região de Pau Brasil. A demora no julgamento da Ação de Nulidade de Títulos sob a Terra Indígena Caramuru Catarina Paragusssu do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe ontem teve mais um desfecho dramatico e como sempre levando mais uma vida de liderança indígena.
Segundo informações das lideranças, por volta das 21:00 horas do dia 23 de outubro de 2010, na estrada que liga o municipio de Pau Brasil a Itajú do Colônia a liderança José de Jesus Silva (cerca de 37 anos), conhecido como Zé da Gata, foi assassinado com um tiro de rilfle 38, por indivíduos que conduziam uma moto, quando a vítima chegava à área retomada da fazenda Bela Vista. Ainda segundo informações das lideranças, Zé da Gata estava levando mantimentos para o pessoal que se encontava na área de retomada quando foi alvejado pelo disparo.
Os Pataxó Hã-Hã-Hãe, cansados de esperar que o STF retome o julgamento da Ação de Nulidade de Títulos incidentes sobre o seu território tradicional, retomaram no ultimo dia 04 de outubro cerca de seis fazendas nos municípios de Pau Brasil e Itajú do Colônia. No dia 10 do mesmo mês, sofreram ataques violentos por parte de pistoleiros contratados pelos fazendeiros invasores das áreas. Esta situação levou uma comitiva de lideranças até Brasilia e uma outra a Salvador, para solicitar que providências urgentes fossem adotadas para evitar que situações de violência como estas viessem a ocorrer, mas parece que não adiantou muito. Acostumados com a impunidade que reina na região, os fazendeiros invasores continuarm seus ataques e ontem conseguiram um dos seus intentos.
Ao longos destes 28 anos de luta pela reconquista de seu território, o povo Pataxó Hã-Hã-Hãe viram agora sua 20a. liderança, Zé da Gata, ser mais um a ter que derramar seu sangue para terem que recuperar seu território. Infelizmente, só para lembrar:
Em 1983, assassinato do indígena Antônio Júlio da Silva, atingido com um tiro na cabeça, por pistoleiros mandados pelo fazendeiro Marcus Wanderley.
Em junho de 1986, uma emboscada deixa gravemente feridos os indígenas Antônio Xavier (dez tiros), Anivaldo Calixto (um tiro no peito), Enedito Vítor (dois tiros) e Leonel Muniz (um tiro). Em novembro de 1986, a aldeia São Lucas é invadida por pistoleiros e soldados da Polícia Militar, fortemente armados. São assassinados os indígenas Jacinto Rodrigues e José Pereira. Uma criança recém-nascida também morre no conflito, quando sua mãe fugia pela mata para se esconder dos tiros.
No dia 29 de março de 1988, é encontrado morto o indígena Djalma Souza Lima, depois de ter sido seqüestrado na aldeia. Seu corpo apresentava vários sinais de tortura: unhas, dentes e couro cabeludo arrancados, castrado e com queimaduras em várias partes. No final de 1988, no dia 16 de dezembro, é brutalmente assassinado o líder Pataxó Hã-Hã-Hãe João Cravim, de 29 anos de idade, casado e pai de três filhos, numa emboscada que liga a aldeia à cidade de Pau Brasil – BA.
Nove anos depois, no dia 20 de abril de 1997, o irmão de João Cravim, Galdino Jesus dos Santos, é queimado vivo em Brasília por cinco jovens da classe média/alta, enquanto dormia numa marquise de ônibus. Galdino estava com um grupo de lideranças, cobrando da Justiça providências para regularização de suas terras. O crime, que chocou o país, até hoje clama por justiça. Antes de entrar em coma, Galdino perguntou repetidas vezes: ”Por que fizeram isso comigo?”
No dia 02 de janeiro de 2002, Milton Sauba é assassinado em frente ao seu filho, quando saiam para retirar leite no curral da fazenda que estavam ocupando. Todos sabem quem são os culpados, mas nenhuma providência até o momento foi tomada.
No dia 18 de julho de 2002, o índio Raimundo Sota é brutalmente assassinado em uma tocaia ao lado de sua casa. Raimundo já havia denunciado há alguns dias que vinha sendo ameaçados por pistoleiros a mando dos fazendeiros da região. Três dias antes do seu assassinato, houve uma tentativa de homicídio que deixou ferido o índio Carlos Trajano, com cerca de 15 balas.
No dia 19 de maio de 2007, o indígena Aurino Pereira dos Santos, 40 anos, casado, foi assassinado a tiros em uma tocaia na região do Taquari, município de Pau Brasil. O índio Aurino era participante ativo desse processo de luta do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe pela recuperação do seu território, participando ativamente de várias retomadas, inclusive na região onde foi assassinado, onde dirigia a retomadas mais recentes na região do Taquari e Braço da Dúvida.
É bom ressaltar que, ao longo destes anos, a FUNAI já realizou vários levantamentos fundiários, tendo pago indenizações pelas benfeitorias de boa-fé à maioria dos proprietários/possuidores. Uma minoria deles – os réus da presente ACO – 312-BA , no entanto, não reconhece a terra como indígena ou discorda do valor proposto pela FUNAI. E, apesar de serem minoria, as áreas por eles ocupadas correspondem à maior parte da TI Caramuru – Catarina – Paraguaçu. São estas áreas que foram no dia 4 de outubro deste ano retomadas.
No dia 24 de setembro de 2008, foi uma ótima oportunidade para que a sociedade pudesse pagar a sua dívida histórica que tem com os Pataxó Hã-Hã-Hãe, que ao longo dos séculos foram tão esbulhados dos seus direitos e mais recentemente, como percebemos na cronologia de violência apresentada acima, tão violentados. Mas infelizmente, apesar do voto favorável do Ministro Eros Grau, o pedido de vista do Ministro Menezes Direito frustou a oportunidade de redimissão da sociedade com a comunidade Pataxó Hã-Hã-Hãe, e a sua demora na retomada do julgamento terminou resultando em mais uma morte.
Mesmo com todo este quadro de violência o povo Pataxó Hã-Hã-Hãe continua acreditando na Justiça e aguarda que todos os criminosos sejam punidos, e que finalmente as suas terras lhes sejam devolvidas, acabando assim com todo o sofrimento vivenciado por esta comunidade. E que finalmente possam viver como filhos de Deus na sua “Terra sem Males”.
É inadmissível que em pleno século 21 situações como estas ainda venham a ocorrer. O povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, seus aliados, parceiros e apoiadores solicitam que medidas urgentes aconteçam de verdade, principalmente a devolução de suas terras, para que possam viver dignamente seu projeto de vida.
Itabuna, 24 de outubro de 2010
Conselho Indigenista Missionário – CIMI.
FONTE: http://racismoambiental.net.br/2010/10/mais-uma-vida-pataxo-ha-ha-hae-e-ceifada-na-luta-pela-terra/
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NOTA: Até quando o Ministério da Justiça vai deixar a questão indígena do Sul da Bahia em suspense? Será que estão aguardando mais mortes?
Repudiamos a violência de ambos os lados: tanto dos indígenas quanto dos não índios.