quarta-feira, 19 de outubro de 2011



Notória parcialidade de magistrados do Espírito Santo


Em 19.02.2010, o Espaço Vital publicou matéria sobre o oferecimento de denúncia, pela Procuradoria-geral da República, pelo suposto envolvimento de desembargadores, juízes, advogados e servidores públicos, entre outros, em crimes contra a administração pública e a administração da justiça, perpetrados de modo reiterado e organizado, no Estado do Espírito Santo.

Na época, a relatora no STJ, ministra Laurita Vaz, acolhendo pedido do Ministério Público Federal, revogou o segredo de justiça, por entender que "o sigilo não se faz mais necessário, tampouco recomendável, ressaltando que, ultrapassada a etapa inicial da investigação, com o oferecimento da denúncia, deve ser prestigiada a regra geral da publicidade, importante instrumento de controle da atuação dos órgãos estatais pelos diversos seguimentos da sociedade civil, característica marcante e inarredável do Estado Democrático de Direito.

A relatora indeferiu, então, o pedido de afastamento dos acusados de suas funções, considerando que, quanto aos magistrados, estes já estavam afastados por decisão prolatada em âmbito administrativo pelo próprio TJ-ES.

A ação reputada de delituosa gira em torno, basicamente, do patrocínio e intermediação de interesses particulares perante o TJ estadual, na busca de decisões favoráveis a estes e/ou outras facilidades que possam ser obtidas por meio da interferência dos agentes que exercem cargos públicos estratégicos para o fim ilícito almejado, em troca de favores e/ou vantagens pessoais.

No curso da investigação, surgiram, ainda, evidências de nepotismo no tribunal, expediente que serviria como elemento facilitador das ações delituosas dos investigados que, assim, poderiam contar com a colaboração de parentes e afins empregados em cargos estratégicos.

Após diligências sigilosas, a investigação chegou a exibir-se ostensivamente, com a execução de 24 mandados de busca e apreensão e sete de prisão temporária, pelos quais os investigados presos foram levado para Brasília, ouvidos, e libertados quando não mais ofereciam risco à instrução processual.

Contudo, após a oferta da denúncia, o MPF levantou questão de ordem no STJ, informando a aposentadoria dos desembargadores acusados, o que lhes retiraria a prerrogativa de foro, e a pendência do RE n.º 549.560⁄CE perante o STF, no qual se discute a alegada manutenção do benefício. Ainda para o MPF, por haver um procurador de Justiça e juízes de primeiro grau entre os denunciados, a competência seria do próprio TJ-ES.

Queria o MPF que os autos não fossem remetidos imediatamente à Justiça estadual, antes do julgamento no STF, sob pena de algumas prescrições da pretensão punitiva serem implementadas e de haver provável desmembramento do feito," consoante tese anunciada em algumas das defesas preliminares apresentadas pelos denunciados, desconsiderando-se a evidente conexão intersubjetiva, que reclama a preservação da integridade dos eventos delituosos, e sua abordagem como um todo, sob pena de obscurecimento da verdade ".

No entender o MPF, mais da metade dos membros do TJ capixaba são direta ou indiretamente interessados no julgamento da ação penal, sendo, por isso, competente o STF para processar e julgar a causa:"Na hipótese vertente, verificou-se mais de uma vez a atuação parcial dos membros do judiciário estadual na defesa de seus próprios interesses e de seus protegidos, conexos com aqueles contrariados pela ação penal, assim como a ausência de condições objetivas de imparcialidade dos magistrados não denunciados. Tudo isso leva à fundada suspeita de que, na instância estadual, a acusação, que se reveste de verossimilhança sobejamente aferível a partir do suporte fático-probatório suficiente ao início e desenvolvimento da ação penal e constitui um momento singular de engrandecimento do Superior Tribunal de Justiça, sofra uma premeditada procrastinação; seja rejeitada ao arrepio dos fatos, de forma a obstar ao trânsito da ação penal; ou, ainda, ao final da instrução, receba uma sentença absolutória, o que se afiguraria rematado absurdo, salvo melhor juízo."

Segundo o Parquet - para quem"a falta de imparcialidade de alguns desembargadores e juízes daquele estado é notória - existe uma teia de relações, compadrios e favorecimentos que traçam laços evidentes entre os denunciados e seus possíveis julgadores na esfera estadual. Tais laços vão desde o auxílio impunível ao funcionamento da organização criminosa a suspeitas de participação não suficientemente comprovadas para inclusão na denúncia e se estendem à prática generalizada do nepotismo e mesmo da fraude em concurso público para favorecer parentes e agregados de boa parte dos atuais integrantes do Tribunal de Justiça, conforme já demonstrado."

A candente manifestação ministerial ainda sustenta que muitos dos magistrados,"se não colaboraram com os crimes, foram beneficiados por práticas de nepotismo e possíveis fraudes em concurso público precisamente pelo grupo que comandava o Tribunal e operava a organização criminosa"e denuncia que - em que pese a"esmagadora maioria dos magistrado do ES sejam honestos, probos e imparciais - "não se pode exigir que, além de honestos, probos e imparciais, sejam também heróis ou mesmo mártires, porquanto faltariam condições objetivas para um julgamento justo tanto no Tribunal de Justiça quanto em qualquer comarca do Espírito Santo, em vista da incontrastável capacidade da organização criminosa desvendada de mobiliza poder em seu favor."

E prossegue: "É preciso reconhecer, com a serenidade que a distância dos fatos e pessoas permite, que cada magistrado honesto no Espírito Santo, de qualquer instância, é um sobrevivente", mas "no caso específico do Judiciário capixaba, conforme se demonstrou, não há garantia de julgamento isento e justo, ainda que seja possível a substituição dos desembargadores impedidos ou suspeitos do órgão competente (Pleno do Tribunal de Justiça), mediante a convocação de juízes de Direito. Por outro lado, seria ingenuidade supor ou esperar que ocorram declarações de impedimento da maioria dos desembargadores competentes para o julgamento da ação penal. Pelo contrário, seria previsível, salvo honrosas exceções, que afirmassem sua competência e imparcialidade com veemência, porque estão vinculados a interesses pessoais indissociáveis da prestação jurisdicional, se se considerar que foi o denunciado ex-desembargador Frederico Pimentel quem franqueou o provimento de cargos a familiares dos que agora se convertem em seus julgadores."

O subprocurador-geral da República arremata sua manifestação qualificando o Espírito Santo como"terra sem lei"de cujos juízes não se pode esperar bravura a ponto de exigir que salvem o Estado"das garras do crime organizado, pois, como já dito e de sabença notória, naquela Unidade da Federação, os criminosos poderosos demonstram seu poder através da violência contra os representantes dos Poderes Públicos, inclusive magistrados."

Ao apreciar a questão de ordem suscitada pelo MPF, a relatora reafirmou o entendimento de que não há prerrogativa de foro para quem deixou o cargo, pois a prerrogativa se relaciona ao exercício e não a um privilégio pessoal.

Porém, avaliando o tema do alegado interesse dos membros do TJ-ES no deslinde do feito, a ministra Laurita Vaz expressou que descabe, neste momento processual, ao STJ d ao STF decidir a questão, devendo a próprio corte capixaba se pronunciar acerca do assunto, "observando-se, assim, a sequência natural do exercício da jurisdição."

Por isso, por força da aposentadoria dos desembargadores denunciados, a ministra declarou a incompetência do STJ e ordenou a remessa dos autos, expedientes avulsos e petições ao TJ-ES.

O acórdão, da Corte Especial do STJ, foi unânime e publicado em 17.11.2010, sobrevindo três embargos de declaração, todos rejeitados em decisões publicadas 16 de fevereiro já deste ano de 2011. (APn nº 623).

Leia a lista de acusados e as respectivas imputações:

1. ADRIANO MARIANO SCOPEL Empresário corrupção ativa majorada (artigo 333parágrafo único do CP);

2. ALINALDO FARIA DE SOUZA Desembargador do TJES corrupção passiva privilegiada (artigo 317 parágrafo 2º do CP; corrupção passiva privilegiada duas vezes (artigo 317parágrafo 2º, na forma do artigo 71, ambos do CP); prevaricação (artigo 319 combinado com 71 do CP);

3. ALOÍSIO VAREJAO Vereador da Câmara Municipal de Vitória corrupção ativa majorada (artigo 333 parágrafo único do CP);

4. BÁRBARA PIGNATON SARCINELLI - Servidora demitida do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, do qual era Diretora Judiciária de Registro, Preparo e Distribuição quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva privilegiada (artigo 317 parágrafo 2º doCP); corrupção passiva majorada (artigo 317 parágrafo 1º combinado com artigo 29, ambos do CP); corrupção passiva privilegiada, prevaricação e falsidade ideológica (artigos 317parágrafo 2º; 319 e artigo 299 parágrafo único, na forma do artigo 69, todos do CP); corrupção passiva privilegiada (artigo 317 parágrafo 2º do CP); Peculato (artigo 312combinado com artigo 29 do CP) e abandono de função qualificada (artigo 323 parágrafo 1º do CP);

5. CRISTÓVAO DE SOUZA PIMENTA Juiz de Direito da Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Vitória corrupção passiva majorada (artigo 317 parágrafo 1º doCP);

6. DILSON ANTÔNIO VAREJAO Assessor do Vereador Aloísio Varejão corrupção ativa (artigo 333 combinado com 29, ambos do CP) e exploração de prestígio majorada (artigo357 parágrafo único combinado com artigo 29, ambos do CP);

7. DIONE SCHAIDER PIMENTEL ARRUDA Servidora demitida do Tribunal de Justiça do Espírito Santo quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317parágrafo 1º combinado com artigo 29, ambos do CP);

8. ELIEZER SIQUEIRA DE SOUZA Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Espírito Santo corrupção passiva privilegiada (artigo 317 parágrafo 2º do Código Penal);

9. ELPÍDIO JOSÉ DUQUE Desembargador do TJES quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317 parágrafo 1º do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317parágrafo 1.º do CP); corrupção passiva privilegiada (artigo 317 parágrafo 2º do CP);

10. FELIPE SARDEMBERG MACHADO Servidor demitido do Tribunal de Justiça do Espírito Santo quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção ativa majorada (artigo 333 parágrafo únicodo CP);

11. FLÁVIO CHEIM JORGE Advogado quadrilha (artigo 288 do CP);

12. FRANCISCO JOSÉ PRATES DE MATOS ex-Prefeito de Pedro Canário crime de responsabilidade (artigo I do Decreto-Lei nº 201/67) e corrupção ativa majorada (artigo333 parágrafo único do CP);

13. FREDERICO GUILHERME PIMENTEL Desembargador do TJES quadrilha (artigo 288 doCP); corrupção passiva majorada (artigo 317 parágrafo 1º do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317 parágrafo 1º do CP); corrupção passiva privilegiada (artigo 317parágrafo 2º do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321 parágrafo único doCP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321 parágrafo único do CP); violação de sigilo funcional qualificado repetidamente (artigo 325 parágrafo 2º combinado com 71 do CP) e estelionato majorado (artigo 171 parágrafo 3º do CP); Peculato (artigo 312 do CP) e exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado (artigo 324 do CP);

14. FREDERICO LUIS SCHAIDER PIMENTEL Juiz de Direito da Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual de Cariacica quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP); exploração de prestígio (artigo 357 do CP); exploração de prestígio (artigo 357 do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, do CP);

15. GILSON LETAIF MANSUR FILHO Advogado exploração de prestígio (CP artigo 357); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, combinado com artigo 29, ambos do CP) e corrupção ativa majorada (artigo 333, parágrafo único, do CP);

16. HENRIQUE ROCHA MARTINS ARRUDA Advogado quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos doCP);

17. JOHNNY ESTEFANO RAMOS LIEVORI Advogado quadrilha (artigo 288 do CP); exploração de prestígio (artigo 357 combinado com artigo 29 do CP); corrupção ativa majorada (artigo 333, parágrafo único, combinado com artigo 29 do CP); exploração de prestígio (artigo 357 do CP);

18. JOSENIDER VAREJAO TAVARES - Desembargador do TJES quadrilha (artigo 288 doCP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, do CP); advocacia administrativa qualificada e corrupção ativa majorada, em concurso formal (artigos 321 parágrafo único; 333, parágrafo único, combinado com 29, combinado com70, todos do Código Penal); corrupção ativa (artigo 333 do CP, o segundo combinado com artigo 29 doCP); exploração de prestígio majorada (artigo 357 parágrafo único do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, do CP) e corrupção passiva privilegiada (artigo 317, parágrafo 2º, do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo321, parágrafo único, do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, do CP);

19. LARISSA PIGNATON SARCINELLI PIMENTEL Juíza de Direito da 9ª Vara Criminal de Vitória quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP);

20. LARISSA SCHAIDER PIMENTEL CORTES Servidora do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317,parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP);

21. LEANDRO SÁ FORTES Assessor da Presidência, demitido, do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP);

22. PAULO GUERRA DUQUE Advogado quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP); exploração de prestígio (artigo 357 combinado com artigo 29 do CP); corrupção ativa majorada (artigo333 parágrafo único combinado com artigo 29 do CP); corrupção passiva majorada e exploração de prestígio (CP artigo 317, parágrafo 1º, combinado com 29, e artigo 357, na forma do artigo 69); exploração de prestígio (artigo 357 do CP)

23. PEDRO CELSO PEREIRA Advogado quadrilha (artigo 288 do CP); exploração de prestígio (artigo 357 do CP); corrupção ativa majorada (artigo 333, parágrafo único, doCP); corrupção ativa (artigo 333 do CP, o segundo combinado com artigo 29 do CP); corrupção ativa (artigo 333, combinado com 29, ambos do CP) e exploração de prestígio majorada (artigo 357, parágrafo único, combinado com artigo 29, ambos do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, combinado com artigo 29, ambos doCP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, artigo 29 do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, combinado com 29 do CP);

24. PEDRO SCOPEL Empresário corrupção ativa majorada (artigo 333, parágrafo único doCP);

25. ROBERTA SCHAIDER PIMENTEL Servidora do Tribunal de Justiça do Estado Espírito Santo quadrilha (artigo 288 do CP); corrupção passiva majorada (artigo 317, parágrafo 1º, combinado com artigo 29, ambos do CP); advocacia administrativa qualificada (artigo 321, parágrafo único, combinado com 29 do CP)

26. ROBSON LUIZ ALBANEZ Juiz de Direito da 6ª Vara Cível de Vitória corrupção passiva majorada duas vezes (artigo 317, parágrafo 1º, na forma do artigo 71, ambos do CP).

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