sexta-feira, 18 de junho de 2010

Modo de vida e meio de vida

Modo de vida e meio de vida




Já citei a ficção “A Máquina do Tempo” de HG Wells algumas vezes e ainda citarei algumas mais. Na última versão para as telas, nossa civilização é destruída em 2037 pela mineração da Lua que colapsa e causa uma chuva de pedras gigantescas. Esta era uma grande viagem na maionese até o desastre do Golfo do México. Agora passou a ser mais um exemplo em que a vida copiou a arte.



Este desastre não é resultado somente da folga norte americana. O andar de cima brasileiro gasta tantos recursos naturais quanto o americano médio. Você, leitor de jornal e usuário de carro é tão culpado quanto eles. “Nós” é mais adequado.



Um carro flex causa problemas sérios também, ainda que não renda imagens tão dramáticas.

O tempo não irá curar tudo, como faz crer a matéria de 2/06 da Revista Veja. Os enormes cardumes de arenque nunca voltaram depois do derramamento no estreito de Prince William em 1989. Resolve limpar o óleo das aves ? Toda mãe sabe não há banho que vá manter uma criança limpa se houver lama no jardim . Os voluntários bem intencionados com luvas e detergente gastam tempo e dinheiro para protelar uma morte por algumas horas. Animais silvestres nem podem ficar em cativeiro por muito tempo e nem podem ser soltos em outro ambiente. Eles voltarão para o petróleo lá fora depois de posar para as fotos.



Estado e iniciativa privada se unem nesta peça de ficção. O Estado age como prostituta barata, fazendo de tudo pelos vultosos impostos, e a empresa deseja maximizar seu prazer lucrativo e minimizar seu pagamento de multas, limpeza e restauração. Se você procurar imagens do derramamento no site da NASA, encontrará ao lado imagens mostrando a liberação “natural” de petróleo no Golfo em 2009, como que dizendo que isto é parte da vida da região. ‘É coincidência ?



Não tenho ouvido mais falar do pré sal nestes dias. Éramos o grande fornecedor de energia verde antes de descobrirmo-nos deitados no berço esplendidamente negro do petróleo profundo. Se isto acontecer por aqui teremos liderança política para enfrentar a empresa ?



Lembremos o caso do derramamento no Rio Barigu e Iguaçu em 2000. Estado e Federação brigaram pela multa. Como a multa do estado era mais camarada, a Petrobrás pagou rapidinho e isto é disputado pela Federação até hoje. A Petrobrás afirma que “o tempo está resolvendo tudo” mas impede o acesso de pesquisadores à área, assim como tem feito a BP no Golfo.

Estas mentiras são meio de vida para manter de graça um modo de vida sem graça.





____________________________________________________________________________
Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br) é Doutor pela Universidade de Harvard, Professor Associado de Recursos Naturais da Universidade Estadual de Londrina, consultor do programa FODEPAL da FAO-ONU, autor dos livros Biologia da Conservação e Histórias Impublicáveis sobre trabalhos acadêmicos e seus autores. Nos fins de semana ajuda escolas do Vale do Paraíba-SP, Brasília-DF, Curitiba e Londrina-PR a transformar lixo de cozinha em adubo orgânico e a coletar água da chuva.
*****************************************