quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Índios temem ser isolados pela barragem de Belo Monte

G1

A índia Josilda Mendes Arara tem 21 anos e quatro filhos, todos menores de 5 anos. Ela tem uma rotina comum a muitas donas de casa da cidade. Cuida das crianças, cozinha e gosta de reunir as amigas para bater papo de tarde. Mas o tema das conversas é geralmente um só: como preservar a cultura da tribo e garantir a saúde das crianças da comunidade, que fica às margens do Rio Xingu, no Pará, depois da instalação na região da usina de Belo Monte, planejada para ser a segunda maior hidrelétrica do país.

O G1 esteve em Altamira, cidade-sede da obra da usina, nos dia 26, 27 e 28 de julho e publica até domingo (28) uma série de reportagens sobre a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. O G1 acompanhou equipe do Jornal Nacional na cidade. Veja no vídeo a primeira reportagem do JN sobre a usina, exibida na noite de terça (23).


Já foram iniciadas as obras de infraestrutura para construção da hidrelétrica - a primeira reportagem da série do G1 sobre a usina falou do desmatamento para a obra. Mesmo com os questionamentos dos impactos sociambientais na região, o governo diz que Belo Monte é essencial para suprir a demanda energética do país em razão do crescimento econômico.

Para a índia Josilda, da tribo Arara da Volta Grande, a maior preocupação é com a manutenção da principal atividade da tribo, a pesca, e a saúde dos filhos. Isso porque, apesar de a comunidade contar com uma enfermaria, é preciso levar as crianças ao médico em Altamira, cidade mais próxima. O temor é que, com a construção da barragem, os índios tenham dificuldade em atravessar o rio.

"Isso tudo me preocupa. Se secar o rio, vamos ficar sem peixes. E vamos comer o quê? Tenho medo de a gente não conseguir passar pela barragem. Daí, como é que faz? A gente não sabe. Não vai poder levar as crianças no médico?", diz Josilda.

De acordo com a Norte Energia, empresa com quase 50% de participação governamental, não haverá dificuldade para a população indígena.

O projeto prevê que as embarcações sejam içadas por um cabo de aço, mas a empresa ainda ouve as propostas dos índios e dos ribeirinhos para a transposição dos barcos.

A tribo Arara da Volta Grande fica a cerca de 100 km de Altamira - 3 horas e meia de voadeira (barco com motor), meio de transporte mais utilizado para ir à cidade vender peixes e comprar mantimentos. O tempo pode variar dependendo do nível de água no rio em razão da cheia ou da seca.

Quando o G1 esteve no local, a vazão do rio estava baixa, mas a navegabilidade não estava prejudicada. Mesmo assim, em vários momentos do trajeto a velocidade foi reduzida para desviar de pedras que em tempo de cheia ficam sob a água.

Trata-se de uma comunidade bastante miscigenada. Os índios falam português e usam roupas comuns. Uma televisão com antena mais potente permite que todos acompanhem notícias e novelas.

No entanto algumas tradições são mantidas. As casas são de palha, a maioria não tem fogão ou geladeira, eles dormem em redes e as crianças são criadas em meio à natureza. Os homens caçam e protegem a trilho. As mulheres cozinham, cuidam dos filhos e aconselham seus maridos.

Na tribo, há uma escola e uma enfermaria, tudo mantido com ajuda da Fundação Nacional do Índio (Funai). Nos casos mais graves de saúde ou para realização de exames, porém, eles precisam obrigatoriamente ir à cidade.

Josélia Mendes Arara tem 28 anos e oito filhos com idades entre 2 meses e 8 anos. Na gravidez do caçula, disse a índia, não fez pré-natal e não foi ao médico nenhuma vez. No entanto, levar os filhos à cidade também é uma preocupação.

"Por causa do barramento, não poderemos ir para nenhum lugar. A gente fica triste porque não tem resposta de como sair daqui para ir à cidde. O pesadelo está na nossa frente. Querem destruir nossa riqueza. Querem acabar com a vida das crianças. Espero em Deus que essa barragem não saia", diz Josélia.

http://www.olhardireto.com.br/noticias/exibir.asp?edt=31&id=200508